Segue um trecho do livro "O Príncipe de Maquiavel",
retirado do capítulo XVII - "Da crueldade e da clemência,
e se é melhor ser amado ou temido."
Nasce daqui uma questão: se vale mais ser
amado que temido ou temido que amado. Responde-se que ambas as coisas seriam
de desejar; mas porque é difícil juntá-las, é muito mais seguro ser temido
que amado, quando haja de faltar uma das duas. Porque dos homens se pode dizer
duma maneira geral, que são ingratos, volúveis, simuladores, covardes e
ávidos de lucro e enquanto lhes fazes bem são inteiramente teus, oferecem-te
o sangue, os bens, a vida e os filhos quando, como acima disse, o perigo está
longe; mas quando ele chega, revoltam-se. E perde-se aquele príncipe que por
ter acreditado as suas palavras se encontra nu de qualquer outra defesa;
porque as amizades que se adquirem a preço e não por grandeza ou nobreza de
alma, compram-se, mas não se possuem e no momento oportuno não se podem
empregar. Os homens têm menor escrúpulo em ofender um que se faz amar, do
que um que se faz temer, porque o amor está unido com o vínculo da
obrigação o qual, por os homens serem maus, se parte na primeira ocasião em
que surja o interesse, mas o temor é sustentado pelo medo do castigo o qual
nunca se perde. Deve, todavia, o príncipe fazer-se temer de modo que, se não
adquire amizade, evite ser odiado, porque pode muito bem ser ao mesmo tempo
temido e não odiado; o que sempre conseguirá desde que respeite os bens dos
seus concidadãos e dos seus súbditos e a honra das suas mulheres; e quando
se veja obrigado a proceder contra o sangue dalgum, não o fará sem
justificação conveniente e causa manifesta; mas sobretudo não tocar na
propriedade alheia, porque os homens esquecem mais depressa a morte do pai que
a perda do património. E depois, não faltam nunca motivos para apoderar-se
do alheio e sempre aquele que começa a viver da rapina encontra razões para
apoderar-se do que é dos outros, ao passo que as ocasiões de fazer correr
sangue são mais raras e faltam mais amiúde.
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